O AMOR LOUCO, obra-prima de Jacques Rivette, estreia-se finalmente nas salas de cinema portuguesas

O AMOR LOUCO (1969), de Jacques Rivette, estreia-se finalmente nas salas portuguesas. Rodado em Julho/Agosto de 1967, estreado em França em 1969 (simultaneamente numa versão mais curta por imposição dos produtores e na versão integral, na escolha de Rivette   –  e aquela na qual, por unanimidade crítica, ele deve ser visto), foi uma obra que desafiou os códigos de produção da época. André S. Labarthe dizia que "como acontece com todos os grandes filmes, temos a impressão de assistir ao nascimento do cinema".

"Um dos mais belos filmes de Rivette", escreveu Serge Daney. "Uma das mais belas obras da Nouvelle Vague", afirmou Truffaut.


Tornou-se uma obra de culto, difícil de ver, depois de o negativo original ter sido danificado num incêndio (em Portugal, João Bénard da Costa mostrou-o pela primeira vez no Grande Auditório da Gulbenkian em 1976, mas nunca se estreou comercialmente). Este film fleuve secretamente adorado e incontornável na história do cinema francês, finalmente resgatado após um meticuloso restauro digital que vimos na abertura do último festival de Cannes na secção Cannes Classics, junta os ensaios de uma companhia teatral, onde Sébastien/Jean-Pierre Kalfon encena a Andrómaca de Racine, e os altos e baixos da sua relação com a actriz Claire/ Bulle Ogier, numa espantosa mise en abyme em que vida e ficção, teatro e cinema se entrelaçam, marcando um ponto de viragem na obra do cineasta, em que a rodagem, através do acaso e do improviso, se impõe como elemento central, com uma enorme invenção narrativa e gestual, explorando a liberdade dos corpos e do trabalho dos actores, dando-nos, como dizia o cineasta, o "sentimento do presente".


Em entrevista aos Cahiers, Bulle Ogier afirmava, "divertimo-nos muito. Jacques [Rivette] e a equipa estavam fascinados com as nossas invenções e a nossa rapidez. [...] As reacções emocionais entre mim e o Jean-Pierre [Kalfon] vinham sempre de nós próprios. Jacques deu-nos a possibilidade de ir muito longe: ele era um espectador, não daquilo que ele tinha previsto, mas do que os actores lhe propunham. [...] O Amor Louco continua a ser o filme de que gosto mais.


Estreia 13 de Abril de 2024
Cinemas Medeia Nimas e Teatro Campo Alegre


“Rivette não acreditava que o cinema fosse um meio para dar lições: O Amor Louco, ao invés disso, apresenta uma investigação séria sobre os complexos meios de produção do cinema, razão pela qual continua a ser um dos filmes mais poderosos e políticos que surgiram da Nouvelle Vague. [...] Rivette admite ironicamente: 'É um filme que não cessa de terminar. É por isso que dura tanto tempo'.”

Senses of Cinema (Mary M. Wiles)


“Os ensaios, filmados por Rivette (em 35 mm) e pelo documentarista de televisão André S. Labarthe (em 16mm), são reais, e a relação entre Kalfon e Ogier é fictícia, mas isso apenas começa a descrever a poderosa interface entre vida e arte que ocorre ao longo do desenrolar épico e hipnótico do filme; assistir a isso é uma experiência de vida tanto quanto uma experiência cinematográfica.”
Chicago Reader (Jonathan Rosenbaum)


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